sexta-feira, 7 de março de 2025

OLHAR DE MÃE

 



Olhar de mãe

Era um dia um tanto especial quando ela atravessou a Praça Sandoval Azevedo, carregando nos braços seu único filho, com apenas 15 dias de vida. Seus passos eram firmes, mas seus olhos, tão expressivos, transmitiam uma mistura de amor, esperança e um sutil pedido ao universo. Quem a visse, tão linda e serena, poderia jurar que ela conversava com o pequeno, embora não houvesse palavras. Talvez ela estivesse depositando naquele instante todo o carinho e cuidado que o futuro exigiria, como se, em silêncio, estivesse moldando o homem que ele se tornaria.

Naquele olhar, havia um desejo profundo: que ele crescesse forte, generoso, íntegro. Que fosse alguém capaz de ampará-la nos dias difíceis, assim como ela, desde o primeiro instante, o amparava com todo o seu ser. E assim eu o fiz. Durante seus 95 anos, estive ao lado de minha mãe, fiel, inabalável, como se o laço formado naquele instante inicial nunca pudesse ser rompido.

Mesmo enfrentando desafios, mesmo que às vezes minhas próprias escolhas me afastassem de oportunidades ou sonhos, eu nunca a abandonei. Carreguei comigo um compromisso que ia além das palavras, algo sagrado. Reconhecia a força de minha mãe, que, mesmo sendo solo, não hesitou em procurar apoio e confiança em pessoas que pudessem ajudá-la a me criar e educar. Era uma parceria silenciosa, de almas que se entendem sem necessidade de explicação.

Ela me deu tudo o que tinha: amor, ensinamentos, coragem. E eu só pude retribuí-la com lealdade, gratidão e uma presença constante. Não houve arrependimentos, nem queixas, apenas o vínculo eterno de mãe e filho, uma força que o tempo, a distância ou qualquer dificuldade jamais conseguiu abalar.

Não poderia terminar este texto sem falar do fotógrafo Pedro Comelo que é merecedor de aplausos pela sensibilidade única de sua lente, que captou algo mais profundo do que uma simples imagem: a essência do amor. Sua fotografia eternizou o olhar de uma mãe para o seu filho, um olhar que fala sem palavras, carregado de carinho, proteção e esperança. É preciso mais do que técnica para registrar algo assim; é preciso visão, alma e uma conexão com o momento. Pedro conseguiu transformar um instante em eternidade, revelando, em uma só imagem, todo o universo que cabe entre uma mãe e seu filho.


* A crônica acima faz parte do meu livro O MENINO DO LARGO DO ROSÁRIO

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